29 de dez. de 2010

As janelas.


A janela é onde a gente olha, onde a gente espera. O que as pessoas esperam? O que ela espera?

Várias pessoas dispostas nas janelas. Olhamos para o tempo, para o céu, o sol, o futuro. Imaginamos um amor, a chegada dele, triunfante ... ou não.

Pessoas com bobs nos cabelos, coçando o nariz, um cavalo passa, um carrão ... As janelas eram nossa vista para o mundo. As casas todas com suas janelas à vista, mirando a vida lá fora.

Hoje as casas não têm janelas para as ruas. Eu quero no projeto meus cômodos todos virados pro quintal, todo mundo com vista pra piscina, pra área de lazer! Nossas casas têm vida própria, nossas vidas costumam ser mais interessantes do que a rua.

Será? Nossas vidas são mais interessantes porque não vemos mais a vida pela janela. Vemos pela televisão e vemos através dos computadores, celulares... Mas, nem sempre o que vemos por essas máquinas é a vida acontecendo naquele momento, há realidade e há ficção.

Entretanto, estas são novas janelas que nos permitem olhar, e o olhar ainda se dá através de um quadrado ou um retângulo. Veja, nem os formatos mudaram! E a janela antiga? Ela também, nós dizemos que abandonamos nossos costumes, mas na verdade, se repararmos bem nós não os abandonamos.

Ainda há as antigas janelas, voltadas para as praças, e há hoje nos apartamentos e casas, construídas mais atualmente, grandes janelas, varandas para mirar o mundo, o jardim, o parque.

Suntuosas ou não as vistas são pelo menos em parte iguais, o céu não faz distinção entre nós, todos podemos avistar um pedaço dele de nossas casas.

Ele não distingue, nós é que dificultamos e selecionamos demais o espaço e às vezes deixamos o outro sem visão, sem céu, sem vista para o sol, sem vento.

Mesmo com vista para o vizinho, a janela continua lá. Ela nos deixa ver, alcançar mais longe, além da nossa casa, mas ao mesmo tempo nos protege um pouco, reserva mais do que uma porta aberta, não?

A porta é aberta demais, escancarada deixa uma pessoa passar. A janela não. A janela protege um pouco.

O interessante é como as coisas mudaram. As janelas eram meio mal vistas. Quem mirava o dia todo por ela era um “à toa”. Eram as fofoqueiras. Agora todos que miram uma janela parecem estar sérios, fazendo algo importante.

Mas, será que isso é verdade? Os fofoqueiros mudaram de janela, olham a vida alheia pelo orkut, facebook, fazem intrigas pelo msn. E, eles vivem? Ou vivem a vida alheia?

E aqueles que se dizem mais inteligentes, bons o bastante para não fofocar e não ver a vida alheia nas redes sociais; o que fazem eles?

Os sabidos vêem filmes, documentários, lêem livros. Huuummm. E, o que são essas coisas? São objetos, coisas, que nos mostram vidas de outras pessoas, pessoas que não conhecemos, mas destas sim podemos falar mal ou bem, porque parecerá inteligente.

Podemos comentar as coisas que fizeram e disseram alguns, falar da vida de Machado, de Woody, de Saramago, de Latour, de Santos, de Scorsese, de Montenegro, de Poulain, porque essas são pessoas das quais falar nos faz mais importantes.

Seguir o que dizem algumas pessoas ditas inteligentes também nos torna inteligentes.

Assim, se tivermos como vizinhos grandes pensadores e os olharmos, e vigiarmos seus passos, seus costumes e dissermos coisas que eles também dizem, seremos também inteligentes. Como nem sempre podemos fazer isso hoje em dia, fazemos pela internet. Acomapanhamos seu twitter ...

Mas, se fizermos o mesmo com pessoas menos vangloriadas pela sociedade, aí seremos completos idiotas.

Nos dois casos, parece não haver muita vida. Mas, assim é nossa sociedade. Todos observamos bem o que os outros fazem, por diferentes janelas, quadrados, caixas, técnicas.

E nós somos assim. Frágeis, temos medo de nos expor demais,tentamos nos proteger, enxergar o outro para depois pisar, vamos em bando, repetindo as coisas e mudando aos poucos.

E, pelo jeito a coisa segue por aí. Se nós passamos a nos relacionar com o meio apenas através da técnica, parece que, cada vez mais, estamos nos relacionando um com o outro também apenas através das técnicas. Onde isso nos levará? ... Ao que parece, até então, nem as janelas podem mostrar.

cintia godoi